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Texturas
14ª exposição individual
TEXTURAS

Teve lugar no salão da Associação Comercial de Braga, com entrada pela Rua do Souto e transparência total para a Praça do Município. Fez-se a exposição e lançou-se um livro singular, uma plaquette, como lhe chamou o autor, Miguel Louro, ou conjunto de “Seis poemas com destino” de Mário Dias Ramos inscritos sobre as texturas do fotógrafo, algumas delas coloridas pelo processo de “viragem”, técnica que o autor aprendeu por si e pelos livros e que consiste na re-oxidação dos sais de prata por outras substâncias químicas que dão a cor. Os poemas ficaram a ler-se sobre uma textura de escrita e o livro aparelhou-se com fio vermelho, no seguimento da própria linha do destino. Foi obra de Miguel Louro, exercício criativo que selou uma amizade com Mário Dias Ramos. Há encontros felizes!

A abertura da exposição foi sui generis, e não só pela presença de autoridades civis e eclesiásticas, ou de um número elevado de amigos e de compagnons de route. O autor dos poemas foi apresentado por João Velhote. Os trabalhos do fotógrafo foram analisados por José Machado. A cerimónia inaugural contou ainda com a intervenção musical de Gustavo Brandão e a leitura dos poemas de Mário Dias Ramos por Braga Amaral.

Escrevi, em 1997, para uma compreensão de alguns sentidos e Texturas:
“Mas como procurar então os sentidos e que sentidos procurar?
Contemos uma história, a mesma: no princípio era a escolha assumida do preto e do branco, ou seja, era a aceitação do poder da luz que, refletindo nas coisas e entrando em uma curiosa máquina as recriava, agora em uma texturada película de papel preparado, segundo as ordens e disposições de um sujeito em viagem e devaneio por lugares de curiosidade múltipla, feito também revelador e impressor da sua própria obra. O resultado foi este, o de vermos agora em correria de olhar, na horizontalidade mais propositadamente monótona, uma série de evocações de coisas e de estados de espírito, em ritmo de diversidade, que se fulguraram aos olhos e às experiências fotográficas do sujeito viajante como possuidores de um grau elevado de beleza, aqui sempre entendida como bem estar perante o objeto fotografado.

E donde vem este bem-estar ou olhar tranquilo? Onde sossegam meus olhos? Sossegam na voragem de ver. De ver, guiado pela força narrativa das linhas, das nervuras, das margens, das manchas, dos tamanhos, das transparências e das reflexões, das fracturas, dos sulcos, das espessuras, das parecenças e das analogias, das assimetrias e dos contrastes, que as coisas fotografadas possuem. Entrando em diálogo com o acaso - como se conversássemos também com o teto do mundo, para me valer de Saramago em Todos os Nomes - poderíamos tomar a pergunta: que viu nesta tão natural quanto involuntária disposição das coisas, que viu nestas marcas e combinações do tempo, que viu aqui o fotógrafo que o tenha surpreendido tanto? Que vemos nós, afinal? Viu, antes demais, um bom remédio para as horas de tédio e para os males ou enxaquecas do mundo, tomou para si mesma o sentido da terapia que se inscreve na contemplação, viu para dentro e para fora de si a força indutora das palavras que faltam.

Em tempo de conflitos e de derrapagens ecológicas, em tempo de emergência de primitivismos culturais e de empréstimos obrigacionistas ou de trocas livres de toda a espécie de parafernálias, importam estes gestos de procura de momentos íntimos. Retirar do quotidiano das experiências aquelas que fixam os momentos ou instantes da relação da pessoa com as coisas, descobrindo nelas superfícies de contacto, de contacto táctil, visual, cinético, mas também simbólico, é tarefa de testemunho, congratulante q. b. para nossa própria estima.

Remontaremos, na história da fotografia, tao recheada de “poetas armados de um aparelho fotográfico”, a Alfred Stiglitz (1864-1946) no período de 1900 a 1920, cujas fotografias da natureza procurava que correspondessem a estados de alma, e por isso as nomeava de “equivalências”; mas também deveremos atar Edward Weston (1886-1958), no período de 1920 a 1940, que fotografou as texturas e as variações das formas; ou citaremos Ansel Adams, ou Minor White, de 1940 a 1960, pois para este último a trabalho do fotógrafo deveria ser o de “transcender o tangível para atingir o intangível”, transformando-se assim o objeto fotografado em metáfora de outra coisa (as equivalências metafóricas... na sequência de Stiglitz): “as formas e as texturas dos objetos sobre os quais incidiu a sua objetiva não são de facto senão metáforas de um clima particular, duma dada emoção” (219), assim escreveu um crítico sobre a sua obra. (Vidé: Les Grands Photographes, 1840-1960, (3ª ed. Francesa) 1976, Time-Life International (Nederland) B.V.)
Não estamos perante um trabalho de conceptualização e de argumentação fotográficas de fundo, em torno de um sentido para a estetização do quotidiano, mas estamos perante um trabalho de enchimento discreto dos vazios da rotina do olhar, sobretudo na frequência deste tempo ser muito de passar, ver e nada sentir, enchimento esse que se faz com gestos mínimos da fixação das superfícies, no sentido de as tornar parceiras de outra superfície, a pele física com que nos apresentamos uns aos outros. Tal como Gabriela Llansol descobriu cheios de narratividade os objetos, os lugares, as atmosferas e os sítios da casa, descobrindo-lhes a densidade cultural e patrimonial na criação e educação dos sentidos que cada personagem transporta consigo. (Vd. Um beijo dado mais tarde, Edições Rolim, 1990)”
“Talvez seja a criação livre, de um ecletismo vagueante entre o registo de sensações fugazes de “Texturas”, ao olhar social de “Crianças” ou ao tecnicismo da fotografia de ilustração, que satisfazem a volubilidade de um carácter que o assumir de responsabilidades contém.” - Cândido Barroso Gonçalves, 2000.
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